Governo francês derrota com folga duas moções de censura protocoladas pela oposição como reação ao caso Benalla

O caso Benalla continua movimentando a vida parlamentar na França. Nesta terça-feira (31 de julho), duas moções de Censura foram protocoladas e votadas na Assembleia Nacional (ALF). Esse instrumento parlamentar, se aprovado, leva à queda do governo empossado pelo presidente da República. No entanto, as duas moções, como esperado, foram rejeitadas.

A proposta protocolada pela direita e defendida pelo presidente do Grupo Les Républicains (LR), Christian Jacob, recebeu 143 votos. A esquerda, que não quis se aliar ao adversário ideológico, apresentou outra moção encabeçada pelo grupo Comunista. Ela recebeu apenas 74 votos. O número necessário para aprovar tal reprimenda ao governo é de 289 votos a favor. 

A oposição, de esquerda como de direita, continuam decididos a buscar a “verdade” sobre os eventos envolvendo a participação de Alexandre Benalla, ex-subchefe de gabinete da Presidência da República francesa, durante as operações de controle da ordem pública no entorno das passeatas de protesto do Dia do Trabalho (1° de maio).

Após uma sequência, na qual duas Comissões de Inquérito Parlamentar (CPI) foram criadas no Congresso francês para investigar os fatos em torno do caso, em que inquéritos policias terminaram em indiciamentos e que o executivo iniciou procedimento de demissão do guarda-costas no centro do escândalo, o hemiciclo da Assembleia Nacional foi o palco de mais uma tentativa de desestabilização iniciada pelas oposições a maioria macronista.

Christian Jacob (esq.) Edouard Philippe (centro) e André Chasaigne (dir.) Durante sessão que discutiu duas moções de Censura contra o Governo Francês

Duas moções de Censura, uma de origem comunista e apoiada pela esquerda e outra de direita apresentada pelos partidários de Les Républicains (LR), foram protocoladas contra o governo dirigido por Edouard Philippe. Se aprovados, qualquer um desses instrumentos parlamentares conduziria à queda do gabinete dirigido por Philippe. No entanto, mesmo que uma das moções obtivesse o apoio de todos os partidos de oposição, ainda assim ficaria abaixo do número mínimo de 289 votos exigidos para que seja aprovada uma tal medida de repúdio.

Os resultado, aliás, falam por si. A direita parlamentar recolheu 143 votos e a moção comunista 74 sufrágios dos colegas de Câmara.

Por esta razão – a impossibilidade real de alcançar o objetivo de censura ao governo – que o primeiro ministro, ao responder às reprimendas que lhe foram endereçadas, permitiu-se tachar as moções de “instrumentalização política”, através da qual “se busca algo inteiramente diferente da verdade”.

De acordo com o premier, “os eventos do 1° de maio não dizem nada sobre a Presidência da República. As tentativas de implicar o presidente da República [Emmanuel Macron] não tem outro interesse que o [de cunho] político”. Para ele, ainda, “a democracia funcionou”. Uma referência às CPIs abertas, ao envolvimento da Justiça ou aos atos de punição tomados pelo Executivo antes e após as revelações do Le Monde.

É claro que a oposição não vê o caso como uma simples tentativa de manchar a imagem de Emmanuel Macron. Ao defender a moção que protocolara, Christian Jacob, presidente do grupo LR na Assembleia, afirma que a história guardará do episódio a “combatividade” da oposição, sem a qual, nenhuma ação de inquérito teria sido iniciada no Congresso, acredita o deputado.

Em estocada sem firulas, Jacob mirou o coração pulsante do escândalo suscitado por Benalla: “no começo, há dois pesos e duas medidas. Um regime de favores que foi decidido por Macron pessoalmente.”, resume o líder da direita.

Este comportamento, que o chefe do partido LR vê como faccioso e complacente, seria grave, porque ofenderia os policias do país. “Como os senhores querem que, nestas condições, os policiais, os brigadianos, os funcionários tenham confiança no rigor do chefe do Estado, que se mostra culpado de uma tal injustiça”, questiona o parlamentar.

Já no campo da centro esquerda, que não quis se aliar à moção de direita, todos se juntaram ao documento assinado pelo grupo Comunista. Para o chefe do grupo da Esquerda Democrática, André Chasaigne, “o caso Benalla, revelado pelo cotidiano Le Monde, permitiu de retirar o véu sobre a realidade do exercício do poder pelo presidente da República”, bradou da tribuna, desde a abertura da intervenção, o veterano comunista.

Na visão deste homem de esquerda Emmanuel Macron, ao invés da imagem de arauto da moralidade da qual o candidato se investira durante a campanha de 2017, o presidente, doravantemente, mostra-se “impetrado em um verdadeiro escândalo de Estado”, fulminou Chasaigne.

De acordo com o chefe do grupo de esquerda, o caso expõe “um sistema de impunidade, de mentiras e de privilégios”, em referência às medidas tomadas contra Alexandre Benalla, consideradas, desde o início, brandas pela oposição.

André Chasaigne vê também no episódio razões para contestar o regime presidencialista em vigor desde 1958 na França. “É a hiper-concentração de poderes nas mãos de um monarca eleito que enfraquece o princípio de separação dos poderes” estima o parlamentar.

“Chasaigne continua a fustigar o ‘presidencialismo inscrito na constituição’. Na opinião do legislador, o caso Benalla, “uma vez mais enfraqueceu o Estado de direito”. E lembrando a fórmula do célebre filósofo, ele arremata: ‘todo o poder sem limites não saberá ser legítimo’ “.

 

E citando Charles de Secondat – célebre sob a alcunha de Montesquieu, o iluminista francês que teorizou sobre a separação dos poderes ao longo do ensaio de filosofia política “O Espírito das Leis” –, Chasaigne continua a fustigar o “presidencialismo inscrito na constituição”. Na opinião do legislador, o caso Benalla, “uma vez mais enfraqueceu o Estado de direito”. E lembrando a fórmula do célebre filósofo, ele arremata: “todo o poder sem limites não saberá ser legítimo”.

Nova queixa

E a linha de defesa insinuada, nos últimos dias, por Alexandre Benalla e os assessores e advogados que o assistem durante a crise, sofreu um golpe nesta semana. Um vídeo amador revelado pelo site de informações Mediapart, colocaria em dúvida o comportamento geral de Benalla durante a integralidade do tempo que este passou junto às tropas de Choque de Paris durante o Dia do Trabalho.

Nesse clipe, filmado a longa distância, pode-se ver o guarda-costas e o colega de partido La République en Marche (Lrem), Vincent Crase, conduzindo de maneira coercitiva um manifestante em um outro ponto de Paris. Esta aparente detenção aconteceu horas antes da intervenção na praça de la Contrescarpe, origem do imbróglio e que Benalla tenta justificar como sendo um mero “ato cidadão” em defesa da ordem pública e autorizado pela lei.

O vídeo, que apenas mostra o momento em que o manifestante já está apreendido pela dupla de guarda-costas, sem dar o contexto em que a “prisão”, tal como é vista neste documento, poderia se justificar, coloca em cheque a versão segundo a qual o ex-assessor da presidência não exorbitara as prerrogativas de um simples observador neste dia fatídico.

A primeira consequência dessa recente revelação é a nova queixa apresentada contra Benalla junto ao Ministério Público de Paris. Claramente, os desafios judiciários do ex-subchefe de gabinete da Presidência estão longe de conhecer o epílogo.

DF de Paris

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