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Mobilização em alta em Bourges, França, durante o “9º Ato” do movimento dos Coletes Amarelos
* YAPMAG esteve em Bourges, capital do Berry, para mais uma jornada de protestos de rua do movimento dos #ColetesAmarelos (CAs) na França – Mais de 6 mil manifestantes – violência moderada
* Em Paris, onde a explosão de uma padaria já fez três vítimas fatais, os Coletes Amarelos nas ruas da Capital teriam chegado à ser 8 mil, de acordo a polícia. A passeata progrediu sem incidente mas teve desfecho agitado.
* Em toda a França, o movimento conheceu uma forte alta no nível de participação com cerca de 90 mil manifestante. Na semana passada eles eram 50 mil.
A nossa reportagem passou o dia em Bourges. Esta cidade de 70 mil habitantes foi escolhida por uma parte da ala extremista do movimento como um dos principais palcos deste “9º Ato” dos Coletes Amarelos, que após um refluxo progressivo, parecia, desde a semana passada, reganhar força nas ruas. Os primeiros números do ministério do Interior parecem confirmar esta impressão.
Por volta das 9h, as ruas tortuosas e exíguas da cidade “berruyère” respiravam medo e exalavam tensão. Um odor indecifrável mas facilmente reconhecível. A apreensão estava também nos rostos dos comerciantes que, observavam atentos para a rua desde de o interior das lojas que ousaram abrir as portas desde primeiro sábado de liquidação de inverno, ou nos gestos apressados, de última hora, de outros que cobriam suas vitrines com tapumes outros elementos de proteção. Há dois messes os berrichões assistem às imagens de violência, de vandalismo e de pilhagem do comércio em Paris, Bordeaux ou Toulouse e não parecem saber o que esperar. A preocupação era palpável.
O centro da França e do “9º Ato”
Escolhido pela centralidade geográfica, o ato em Bourges, de acordo com diversas fontes ouvidas durante a passeata, teria sido concebido como uma vitrine ideal para exibição do “pacifismo” dos CAs. E, contra toda a expectativa, a organização em torno deste evento apadrinhado no FB por uma das figuras mais controversas do movimento, Maxime Nicolle, demonstrou um claro esforço de controlar os ardores dos CAs mais exaltados e de guiar a passeata, até o final, sem perturbações ou confrontos violentos contra as forças de polícia – algo que caracteriza os protestos desde à segunda semana de atos de rua.
David, integrante do dispositivo de segurança inédito em um ato de protesto Colete Amarelo, nos contou que eles eram 40 pessoas no total. Eles tentaram exercer à clássica função de proteção, condução e controle do cortejo durante passeatas deste tipo. Funções que os grandes sindicatos de trabalhadores da França, desde de tempos imemoráveis, realizam com perfeição e grande sincronia, mas que este movimento de um tipo inédito não detém o conhecimento.
Uma primeira tentativa que parecia destinada ao sucesso até que, por volta das 15h30, quando a passeata se encaminhava para o seu final, uma encruzilhada mudou o contorno da situação. Sem explicação aparente, uma pequena parte do cortejo se viu afasta do grupo principal, que desfilava à uma distancia de aproximadamente 3 quadras. Entre as duas pontas, uma encruzilada, uma barreia de CRS (polícia de choque francesa) e de veículos pesados que impedia a progressão dos retardatários do outro lado, e uma escolha: Para esquerda o dia acabava sem quebra-quebra nas margens da passeata. Para e direita “o pau iria comer”, conforme o fraseado vivo de imagens de alguns ativistas.
Esta separação de Coletes Amarelos, intercalada pelas forças da ordem, se todos tivessem seguido à esquerda, podia ter levado a simples perda de manifestantes pelo caminho. No entanto, como à Paris, em Bordeaux, Toulouse e outras cidades que conheceram episódios de conflito aberto entre a lei e a massa militante de CAs, foi suficiente que um punhado de ativistas em estado de fúria indissolúvel, ao virar à direita, galvanize uma parte do grande grupo “avante!” e contivesse o reflexo de recuo.
Foi assim que a primeira pedra se arrebentou contra um escudo policial. Foi Assim que uma primeira nuvem de lacrimogêneo cobriu o céu sobre as cabeças dos Coletes Amarelos. E sem novidades, a primeira carga é o último chamado antes que a peça de balé de avanços e fugas comece – sem hora para acabar.
Bourges não escapou a regra, mas viveu um fim de manifestação agitado, sufocante, mas moderado se comparado com os “Atos” anteriores em grandes cidades e na Capital. Mesmo derrotado pela indisciplina e intemperança de alguns CAs, o esforço inédito de bem enquadrar a marcha neste nono sábado de protestos em terras “Berrichonas” pode ter contribuído para uma relativa moderação de parte à parte.
O que também foi um fator apaziguador pode ser atribuído ao temperamento dos CAs locais. Mesmo se Bourges, ao ser descoberta como uma das peças mestras do teatro semanal dos amarelos, foi imediatamente apelidada de “Capital dos Coletes Amarelos” neste “9º Ato”, houve grande mobilização dos “berruyers” (naturais de Bourges). Ela era perceptível e, ao conversarmos com dezenas deles, a moderação e a razoabilidade eram marcas que os distinguiam claramente dos parisienses, amienenses ou outros naturais de Melun, Pontoise ou Sancerre.
Como o exemplo de um casal de aposentados, sofridos pela perda de poder de comprar de suas pensões mas, principalmente, preocupados com o futuro dos filhos e dos netos. Ou ainda um casal de jovens ativos, inquietos com o uso oportunista do movimento pela extrema direita. Eles reclamam do abandono da ruralidade por Paris e pelas instituições de Estado que a Cidade Luz hospeda.
Ambos os casais, diferentemente do intempestivo e limítrofe revolucionário padrinho e co-organizador do evento de Bourges, não pedem a queda do presidente Emmanuel Macron. Não desejam a destituição da Assembléia Nacional, nem reclamam eleições antecipadas, um governo de transição ou a extinção da Presidência da república. O que querem é que eles, seus filhos e vizinhos, nas pequenas cidades como na campanha, “possam comer no final do mês”
Eles evitaram todas as armadilhas da radicalidade militante dos Coletes Amarelos mais acalorados. Quando conclamados à “avançar” ou às “armas”, como em uma Marseillaise capenga, e, enquanto outros faziam soar à fúria e fogo, indiferentes, eles deram de ombros e seguiram o caminho traçado pela Prefeitura de Polícia que, finalmente, os convinha perfeitamente.
Os dois cortejos – um que respeitou o perímetro determinado pelas autoridades, e um outro que tentou forçar a passagem em zona central proibida, terminaram o dia pelas 18h. Uns calmamente e outros sobe os tiros de bombas de gaz lacrimogêneo disparados pelos mais de 400 polícias presentes na capital do Berry.
Ao deixarmos a cidade, às 19h, Bourges ainda exalava aquele odor indecifrável de tensão do início da manhã, Contudo, a calma voltava à reinar pouco à pouco. Um tanto mais tarde, no meio da noite, a Prefeitura de Polícia do Berry informou que houveram 15 prisões preventivas decretadas – 14 ocorridas durante as diversas blitz realizadas antes da passeata em toda a adjacência e uma em Bourges, durante o dia em confronto, contra um ativista que teria agredido um CRS. Os feridos foram 11, sendo dois entres os policiais. Um modesto balanço visto o grande número de manifestantes nas ruas estreitas desta calma cidade do centro da França.
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DF de Bourges, França