Frente intersindical convoca nova jornada de mobilização e governo reafirma determinação de reformar em mais um dia de caos na França

Nesta sexta-feira (06 de dezembro),  mais de 80% dos metroviários de Paris e dos maquinistas da estatal dos trilhos SNCF aderiram à greve que entra no segundo dia de mobilização contra a reforma do regime de aposentadoria na França. Nove dentre as 14 linhas do metrô parisiense estiveram paralisadas. Outros meios de transporte, como trens interurbanos, ônibus e bondes funcionaram parcialmente e, especialmente, em horários de ponta.  No resto do país, Os trens bala (TGV) e regionais também estiveram paralisados ou com funcionamento precário, causando transtornos e obrigando muitos franceses à improvisar.  No início da noite, a circulação na região parisiense era lenta, com mais de 650 quilômetros de congestionamento. Os professores da Educação Nacional, fortemente mobilizado ontem (05 de dezembro), voltaram maciçamente as salas de aula.

Um dia depois da maior greve geral em pelo menos uma década – cerca de um milhão de pessoas nas ruas – o primeiro ministro falou aos franceses e confirmou a determinação do governo de reformar as regras para a aposentadoria dentro do calendário previsto mas “com respeito do dialogo social”, salientou Édouard Philippe, no final da tarde.  A Frente Intersindical, reunida pela manhã, também reafirmou a determinação oposta – de derrotar a reforma pelas ruas. Os lideres das principais centrais decidiram por mais uma jornada de greve geral para a semana que vem (terça-feira, 10 de dezembro). O embate entre o movimento social e o palácio Matignon deve se estender e o desenlace dependera do fôlego dos grevistas, da tolerância e apoio do população afetada pelo paralisia dos serviços públicos e pela resistência do governo às consequências de um possível conflito duradouro.

Por enquanto, de acordo com uma pesquisa de opinião, realizada na semana passada e revelada na última quarta-feira pela rádio generalista RTL que encomendou a consulta, 69% dos entrevistados se disseram solidários dos grevistas e 70% se declararam inquietos com a falta de detalhes sobre os planos do governo apresentados até agora. Justamente, tendo em vista a rejeição da reforma e a demanda por esclarecimentos, Philippe, entre os anúncios  desta tarde, defendeu o processo de elaboração do projeto de reforma devido a necessidade de escuta de todos os envolvidos e de transparência. Mas o longo período de gestação deve chegar ao final na próxima semana, quando o premier pretende apresentar “o projeto na sua integralidade” aos franceses.

Ele reconhece que a mobilização, no seu segundo dia, provocou transtornos “previsíveis” e diz medir o quanto “a vida de todos [os nossos concidadãos] é afetada. Contudo, ele voltou a insistir nas promessas que antecederam  a grande greve de ontem: Maior justiça social através de um sistema universal “verdadeiramente solidário” entre as gerações, perenização das novas regras, respeito do direito adquirido pelos atuais funcionários sob regimes especiais e revalorização dos salários das carreiras cuja remuneração dos primeiros anos é vista como muito baixa e que, de a acordo com o relatório oficial que orienta a reforma, seriam os grandes “perdedores” do novo modelo defendido pela maioria governamental.

Um discurso ainda vago mas que aponta para um desejo de dialogo. Isto porquê, tanto o presidente da República Emmanuel Macron, quanto Édouard Philippe, sabem que uma reforma tão ambiciosa precisa conquistar o apoio da opinião pública e uma certa colaboração – ainda que retórica – de uma parte dos setores sindicais. Caso contrario, um longo período de paralisação de setores essenciais dos serviços públicos pode levar todo o projeto ao naufrágio. O exemplo de 1995 pesa sobre todos os envolvidos no lado do poder.

As garantias, vagas mas notáveis, ao respeito do direito adquirido dos ferroviários e metroviários não comoveram os trabalhadores da RATP e da SNCF que mantiveram o movimento de greve iniciado ontem e que deve se estender até terça-feira, pelo menos, dia da próxima mobilização nacional decidida mais cedo pela manhã.

Em paris, trânsito lento,  sistema “v” e tele-trabalho

No Bairro  de negócios da Défense, à poucos quilômetros do Arco do Triunfo de Paris,  o movimento na estação de transportes Grande Arche, de acordo com comerciantes que trabalham na galeria que cintura as dependências, foi maior que o de ontem, mas bem menos intenso que habitualmente. Mesmo se muitos puderam voltar ao trabalho graças aos poucos trens da linha A interurbana ou da linha 1 automatizada do metrô parisiense que funciona normalmente, a quantidade de trabalhadores que efetuaram parte das tarefas habituais em casa através da Internet deixou a movimentada estação com um ar de final de semana. Algo que não agrada a totalidade dos vendedores e proprietário de lojas e comércios com quem YAPMAG conversou no inicio da noite. Muitos temem uma greve mais longa devido ao impacto negativo no volume de negócios que os dois dias de mobilização já teriam causado.

Presentes na estação, agentes de orientação da RATP procuravam informar sobre alternativas de transporte para os  que ainda precisavam continuar trajeto à partir de Grande Arche. Turistas buscavam saber as condições de tráfico para o final de semana. Uma família do leste europeu, com ingressos que custaram 80 Euros cada, avaliavam as chances de ir até o parque europeu da Disney posto que a linha A terá um fluxo extremamente reduzido. Situações variadas que o funcionamento normal ou mínimo de algumas linhas de transporte não necessariamente mitigam as dificuldades.

Outros, como Sadik, executivo de 38 ano, de terno e gravata e ar descontraído, confessa que ele, diferente de outros na Défense ou pelo país, “teve sorte”. Isso porquê ele mora em Paris perto da linha 1 que funcionou em cadência regular e que é o principal meio de acesso ao maior bairro de negócios da Europa. Entretanto, conta Sadik, que, na empresa onde oficia, 80% dos colegas trabalharam de forma remota nos últimos dois dias. “E esta deve ser a situação para o inicio da semana que vem”, prevê. Apesar do transtorno que a greve traz ao funcionamento normal das diversas empresas com sede nos arranha-céus do oeste parisiense, Sadik se diz preocupado com o futuro das pensões na França e, caso o projeto do primeiro ministro não lhe traga segurança, ele diz que apostara na determinação dos compatriotas do serviço público “que podem fazer greve por todos nós e derrubar a reforma”, explica.

Na França, os trabalhadores do setor privado tem direito de greve mas perdem o dia de salário caso o exerçam. Este também é o caso do setor público, mas a tradição dos fundos de greve entre os sindicatos da função pública amortecem o impacto das paralisações.

Quando se tem que improvisar, no país de Victor Hugo, se fala que a pessoa tem que encontrar uma alternativa através do sistema “D” – como débrouille – ou vire-se, em bom português. Num dia como hoje, o sistema “V” foi acionado constantemente pelos franceses. Como no caso de Coralie, contadora em um grande grupo de seguros com sede também na Défense.

Habitante do Leste parisiense, ela pode embarcar, “bem cedo” em um dos primeiro trens que circularam pela manhã no horário de ponta. No entanto, nesta noite, ao deixar a repartição, sem opções e precisando ir ao centro de Paris ela contou com a boa vontade do marido para poder chegar lá. “Mas eu vou chegar atrasada”, lamenta, “Com o trafico intenso, já faz três horas que ele [o marido] esta preso em engarrafamentos. O jeito, conta, é “ter paciência e esperar”.

Coralie, que vai poder voltar pra casa, ainda que mais tarde, sem grande sufoco, diz que não pretende sair de casa no inicio da semana que vem. Com o computador portátil à tiracolo, a especialista contável, deve optar pelo tele-trabalho. “No meu setor, por exemplo, nós somos cerca de 40 colaboradores. Contudo, nós éramos apenas dois no escritório, ontem e hoje”. A razão: Segundo Coralie seria a falta de um sistema “S” simples e cômodo para a maioria dos colegas.

E como experimentou o marido na contadora, mesmo para os que possuem veículo próprio, enfrentar o trânsito é uma opção árdua e estafante. Alias, a Prefeitura de Policia  Paris, também responsável pelo controle da circulação na Capital e arredores, informou que, no inicio da noite, a região registrava cerca de 650 Kms de congestionamento – ou seja, o dobro da medida habitual para uma sexta-feira. Uma situação que Coralie e seus camaradas de trabalho buscam evitar.

 Previsão: Como será o final de semana dos franceses?

Com a decisão tomada pela intersindical, de convocar uma nova jornada nacional de mobilização, a greve nos transportes deve se estender até terça-feira que vem em todo o país. Em paris, a RATP publicou no site da empresa as previsões para amanhã. O tráfico será “extremamente conturbado”, com as mesmas 9 linhas  paralisadas e os trens interurbanos que trafegam por Paris em funcionamento parcial das 13h às 18h.

Do lado da SNCF, a empresa pública dos trilhos prevê um tráfico também perturbado com cerca de 15% da frota de TGVs e cerca de 30% da frota regional circulando. A SNCF ainda recomenda que os parisiense evitem os trens interurbanos também na segunda-feira, devido à grande adesão de maquinistas à greve iniciada na quinta-freira.

 

 

DF de Paris

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