Maud Chirio: “Estamos assistindo ao vivo a fascização do Brasil”

Ontem, em entrevista ao site independente francês Bastamag.net, a historiadora francesa Maud Chirio, especialista do militarismo no Brasil, viu a vitória de Jair Messias Bolsonaro do Partido Social Liberal (PSL) como “mais provável” resultado. Um desfecho que, na opinião da pesquisadora, seria como assistir “ao vivo a fascização do Brasil”.

Como disse, há uma semana, à YAPMAG, Chirio não classifica Bolsonaro e o movimento que o apoia de fascista. Mas vê similaridades históricas de comportamento e de retórica bem como das pautas ultraconservadores que fazem parte da plataforma política do pesselista. Daí o termo “fascização”.

A reportagem de Bastamag, como em nossas colunas, Maud Chirio insistiu em classificar o capitão afastado das Forças Armadas como sendo um candidato de Extrema Direita (ED) com o amparo ideológico de movimentos igualmente extremistas. “Não há menor dúvida, Bolsonaro é claramente de ED, com uma certa tonalidade fascizante.” sentencia. Uma classificação que é rejeitada pelos apoiadores- dos mais convictos e ideológicos aos neo-bolsonaristas menos atentos à política.

Na base da aparente controvérsia, para Maud Chirio, se encontra o fato de que os termos de “Direita e Extrema Direita quase nunca foram reivindicados na cena política Brasileira”, explica. Como ensina a historiadora, após a ditadura militar iniciada em 1964, “estas etiquetas perderam a credibilidade… Mesmo o regime militar era pouco inclinado a utilizar o qualificativo de direita, pois a junta pretendia não ser política”.

Mas como explicar que um candidato que dispôs de apenas poucos segundos durante o período de propaganda eleitoral em rádio e TV chegue ao segundo turno com tamanho capital eleitoral e que, de acordo com a primeira pesquisa de opinião, pareça se dirigir à uma vitória esmagadora? Qual foi o papel das redes sociais nessa história de sucesso?

Para Chirio, desde 2014 as redes foram tomadas por ativistas ultraconservadores. No entanto, a intensificação deste método de propagação de ideias políticas é um fenômeno cujas dimensões não podem mais ser ignoradas e, talvez, tenha sido decisivo em 2018. Em especial, o efeito que a desinformação possa ter causado.

A pesquisadora explica ao magazine eletrônico francês de maneira elaborada: “A narrativa propagada pelas notícias falsas se atacam à esquerda: esta seria ‘comunista’ e ‘revolucionária’. Ela [à esquerda]  levaria a sociedade em direção da depravação moral e anticristã.  O uso de notícias falsas foi crescente, a difusão destas se multiplicou cem vezes nos últimos 4 meses de campanha. Durante à última semana nós rescenseamos entre 4 mil e 10 mil boatos. Na véspera da eleição, circularam falsas declarações de pastores dando apoio à Bolsonaro. No dia seguinte às massivas manifestações de mulheres contra Bolsonaro, 29 de setembro, boatos foram difundidos e pretendiam que estes encontros teriam se transformado em  orgia sexual. Fotomontagens mostram Fernando Haddad [partido dos Trabalhadores (PT)]…  distribuindo livros  eróticos à crianças. Outras mostravam Manuela d’Ávila [Partido Comunista do Brasil (PCdoB)] com tatuagens de Marx, Lênin ou Che Guevara; ou o agressor de Bolsonaro [esfaqueado no abdômen no dia 6 de setembro] ao lado de [Luis Inácio da Silva] Lula e de outros dirigentes do PT“.

“Se Bolsonaro for eleito, o que é provável, isto terá em primeiro lugar como consequência a liberação da violência social e política contra [adversários da parte] daqueles que o deram apoio. Há o risco de linchamento de pessoas homosexuais e de assassinatos políticos…”, opina.

Sobre as consequências de um triunfo da ED no dia 28, Chirio vê o risco de um aumento da violência contra membros das comunidades que foram apontadas pelo candidato como sendo parte de uma lista de inimigos a serem neutralizados pelo bem da nação. “Se Bolsonaro for eleito, o que é provável, isto terá em primeiro lugar como consequência a liberação da violência social e política contra [adversários da parte] daqueles que o deram apoio. Há o risco de linchamento de pessoas homosexuais, e de assassinatos políticos…”, opina.

Um roteiro que começa à se desenrolar nas ruas do país em diversas regiões, de acordo com a mídia nacional

O que preocuparia ainda mais numa tal hipótese seria a mansuetude das autoridades na repressão e punição desses atos. ” Podemos temer que esta violência não seja reprimida pelo Estado posto que será perpetrada pelos partidários do novo presidente”, projeta Chirio.

De uma forma geral, Maud Chirio vê uma situação de recuo das liberdades políticas e individuais no pais, em caso de vitória de Jair Bolsonaro. ” […] Sera um regime sem complexos em ter recurso na violência e na repressão. Isto será reivindicado [por uma presidência Bolsonaro]. Nós assistimos, ao vivo, a fascização do Brasil”, decreta.

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